quarta-feira, 24 de junho de 2009

Memorizando o Capitão

Mais um dia de Lima! E começou com os atores fazendo o repertório de movimentos que já citei em postagem anterior, do sistema Laban/Barteineieff: balanço dos calcanhares, elevação da coxa, alongamento homolateral, entre outros, feitos com os atores prestando atenção nos alinhamentos das conexões ósseas, com músicas ao fundo.

Lima acrescentou três movimentos diferentes para levantar do chão: levantar a partir do contra lateral - de lado, em formato de concha, o ator volta a ficar em “X” de bruços, e aos poucos vai levantando, usando as mãos. Levantar com rotação do braço - queda de joelho com propulsão do braço, a mão puxa o movimento em forma de espiral, e o levantar com irradiação central. Aos poucos, ele ia ajustando os movimentos dos atores.

Como hoje fiquei de fora de todos os momentos, pude experimentar observar esse primeiro momento, que já tinha feito ontem. Fazer é muito gostoso, mesmo quando ainda estava descobrindo o melhor jeito de fazer o movimento, e observar também, pois achei tão bonito ver quatro corpos diferentes, com seus limites, suas desenvolturas e facetas, tudo tão tranquilo.

Os procedimentos de Lima e explicações, são muito próprios de alguém que gosta de ensinar. Ele tem prazer em falar sobre o que conhece, e vem dirigindo bem esses encontros. O que eu sento falta é de momentos de conversa sobre os exercícios feitos. No entanto, se essa conversa de que senti falta tivesse acontecido, me pergunto se não teria se estendido muito, e se os atores teriam perdido outros momentos tão importantes, e se essa é apenas uma sensação minha e não dos atores.

Depois veio a “Roda do Olhar”, agora feita com os quatro atores e Lima. Depois da roda, uma sacudida no corpo, e partiram para experimentação das conexões ósseas, ao som de música, que trocavam ao comando de Lima. Eles também experimentaram as conexões falando um texto do Capitão.

O próximo comando foi caminhar normalmente, sem andar mecanicamente, e quando alguém parava, todos paravam. Em seguida, caminhar com um objetivo, e de repente, mudar de objetivo e caminho. Aos poucos iam sendo acrescentadas outras informações, como caminhar, parar e mudar de objetivo; caminhar interessado no objetivo; etc.

Então, Lima pediu que escolhessem um ponto na sala. Depois um segundo ponto. Os atores foram para o primeiro ponto, depois para o segundo e voltaram para o primeiro. Depois escolheram o terceiro ponto. E assim, memorizaram os três pontos.

Assim, criaram um caminho que passavam pelos três pontos, e esse caminho não deveria ser em retas. Depois de memorizada a trajetória, eles fizeram o caminho explorando os três planos, alto, médio e baixo; os ritmos, rápido, normal e lento; chorando, cantando e sorrindo; raiva, medo e vergonha.

Esse exercício foi bem divertido, os meninos são muito criativos. Lima pediu para que no começo fizessem 100%, o extremo do estado, para depois mudar. E eles não podiam repetir o mesmo elemento de um trecho para outro. Também falou uma frase interessante para os atores, enquanto eles faziam o exercício, e que tomo para mim também, “não queira ser interessante, esteja interessado”.

Para o próximo exercício, as cortinas pretas ao fundo da sala foram fechadas, e no meio da sala foi colocada um cadeira e uma bola. Os atores tinham que escolher dois estados, entrar com um deles, e ao se relacionar com a bola e, estimulados por essa relação, mudar para o outro estado.
Camille foi a primeira. Ela entrou pensativa, e saiu com raiva. Foi bem clara a mudança dos estados, só que ela não havia mudado por causa da bola, pois quando Lima explicou, não tinha ficado claro que a causa da mudança de estado, teria que ser o objeto.

O segundo foi César. Ele entrou envergonhado, e a bola o fez cair, assim ele saiu com muita raiva. Foi interessante ver o César, ele estava em outro registro corporal que eu não conhecia.
Na vez de Marco, ele entrou emburrado, se machucou com a bola, e saiu com mais raiva e dor.
Renata entrou muito triste, mas voltou para trás da cortina, porque o público estava rindo e ela acabou rindo também. Fez isso mais uma vez. Na terceira, ela aproveitou o estado de alegria, entrou rindo e, ao ver a bola, ela ficou triste.

Quando as cenas terminaram Fernando comentou que achou que a de Renata teve uma pequena transição entre as mudanças do estado, e que na cena de Marco ele não viu a mudança de estado. Após uma ligeira discussão “boa” sobre se a dor proporcionou uma mudança de estado ou não, entre Marco, Fernando e Lima, este perguntou a Marco: você concorda com Fernando? Mostre!
Marco fez novamente. Entrou com o estado de raiva, emburrado, e ao se machucar com a bola, passou para o estado de dor, lamentação. Na segunda vez ficou mais clara a mudança de estado, e no fim, chegamos à conclusão que Fernando e ele estavam falando da mesma coisa.

Camille teve a sua segunda chance. Entrou com raiva, mas ao ver César rindo, voltou para trás da cortina. Assim, Lima aproveitou e disse que ela tinha que provar que existe, ver e ser vista. Então ela entrou novamente com o estado de raiva, e ao pegar a bola, ficou tranquila e saiu de cena.

O exercício seguinte partiu do pedido de ontem do Lima, que os meninos pesquisassem as ações de escritor (Marco), lavadeira (Camille), dona de casa (Renata) e pescador (César). Devo dizer que os meninos foram bem além do que o Lima pediu, e isso foi bom. Utilizaram vários elementos de cena, e criaram ambientes para fazerem as ações dessas pessoas. Enquanto isso, além de ajudar os meninos, Gabriela pesquisava figuras de igrejas, e lia o livro Architecture, Actor e Audience, de Ian Mackintosh. Ronaldo também esteve por lá, e ajudou os meninos.

O que Lima queria com esse exercício era que os meninos experimentassem fazer, o que essas pessoas fazem, e não fazer de conta. A pessoa é o que ela faz, ele disse. Assim, ele foi até Marco, e pediu que ele (que estava pesquisando ações de escritor, de uma forma muito “mostrada”), escrevesse duas estrofes em cordel, de uma passagem do livro do Capitão. Para quem estava de fora, foi nítida a diferença, das ações, do olhar, que Marco fazia antes, e depois, em que ele estava preocupado em fazer o que o Lima pediu, foi mais interessante.

Renata, pesquisando ações de dona de casa, trouxe um som, cantou músicas, comeu milho, varreu, deu café para os vizinhos, em alguns momentos, conversou com as pessoas.

César com seu barco-case, tinha uma rede de pano, uma garrafa ao lado, uma vara de bambu que era o seu remo, entre outras coisas. Ficou um bom tempo, ajeitando sua vara de pescar, pelo que eu entendi, e parecia realmente alguém que ia pescar.

Camille, no início, estava apenas com uma bacia, e os seus outros elementos eram imaginários. Apesar da ideia ser boa, estava destoando dos meninos, que tinham tantos elementos. E já que era para pesquisar as ações, fazer o que uma lavadeira faz, Lima trouxe para ela uma tábua, onde ela poderia lavar roupa, depois eu sugeri que ela pegasse roupas também.

Após a pesquisa de ações, sentados nos ambientes que haviam criado, os atores escreveram os mesmos trechos de ontem, do livro do Capitão.

O exercício seguinte foi um jogo com a bolinha. Em dupla, virados de costas para a platéia, os atores viam uma bolinha que o Lima jogou e decidiam, sem falar, qual dos dois pegaria a bolinha primeiro. Ao pegar a bolinha, o ator jogava para outro ponto do espaço, quando deveria ser pega pelo outro ator. Todas as ações deviam ser feitas olhando para a platéia, e exercitando a triangulação, objeto, pessoa e platéia.

Posteriormente, os atores fizeram o exercício de ontem do banquinho, dessa vez, cadeira. Aquele que entram em cena com a cadeira, têm dúvida de onde colocá-la, depois sentam e contam os trechos do livro que copiaram. Nenhum dos meninos conseguiu passar da primeira frase, também não é fácil mesmo, mas que é divertido, isso é.

Lima então, pediu que eles voltassem para os seus lugares, dessem uma olhadinha no texto e, um por um, com o livro em suas mãos, pediu que eles falassem o texto. Repetiu isso várias vezes. Aos poucos, os meninos iam conseguindo memorizar mais palavras, mais texto. É engraçado ver a cara deles, tentando memorizar, e putos – o Marco, mais especificamente – quando esqueciam.

Por último, como tarefa de casa, Lima pediu que lessem o livro em casa, sem ler em voz alta, apenas com o olhar, memorizando os trechos, e que trabalhassem as ações e os textos separadamente.

Finalizando, os atores e Lima fizeram uma roda de mãos dadas, e com entusiasmo gritaram “Clowns de Shakespeare”.

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