sábado, 18 de julho de 2009

Barracantes

Marco e Fê viajaram para São Paulo, pois nesse sábado eles tiveram duas apresentações da peça Fábulas no SESC Pompéia. Devido a essa viagem não foi apresentado nenhum experimento do Capitão, mas contamos com a presença do grupo Facetas, Mutretas e Outras Histórias, que apresentou a peça Ida ao Teatro. Foi uma apresentação muito gostosa, em que o público se divertiu bastante. Ao final, tivemos uma conversa em que o grupo falou sobre o espetáculo e respondeu à perguntas do público.

quinta-feira, 16 de julho de 2009

O homi dos pulim invocado!!!

Já se foram muitos dias sem que eu conseguisse postar, tempo mais que suficiente para que muita informação deixe de ser registrada, para que muita coisa fique perdida na efemeridade da arte de representar. Que angustia!

Deus meu, que novela mexicana é essa!

Em fim. Tivemos Helder Vasconcelos, que é músico, bailarino e ator. Não foi preciso mais que uma semana para o cara não deixar osso sobre osso em nossos pobres esqueletos. Helder, mais conhecido como o cara dos pulinhos invocados, propôs uma pulsação comum para o coletivo, e que dentro dela poderíamos fazer o que quiséssemos enquanto atores criativos e improvisadores. Ele nos ofereceu vários caminhos para chegarmos até essa pulsação: a música elaborada, o uso de instrumentos, estímulos internos, entre outros.

Fato é que o negócio é bom mesmo. Só vendo para crer. Quem assistir verá. Impossível ficarmos intactos após sua passagem por nosso tablado. Ele nos deixou a pulsar como se a partir de então carregássemos um tambor ancestral dentro de nos que vive sempre a percutir um baião malicioso. Pum, pá cum pá pa pum, pá cum pá pa pum...

Helder, sempre menino, traz em sua sexta também um universo repleto de outras malícias, brincadeiras jocosas, rimas inusitadas, e todo o vigor da cultura popular.

Mas espere, não compre ainda.

Junto com o menino Helder ainda ganhei mais de 10GB de músicas das mais variadas, que vivo a escutar até hoje, sentido saudades de sua passagem furaculosa.

Heldin meu amigo saudades, do samba!

Mas espere, não compre ainda.

Helder ainda apresentou no sábado em nosso espaço, aberto a toda comunidade, no evento Barracantes, o espetáculo Espiral Brinquedo Meu. Foi lindo ver o Barracão abarrotado de gente suada, cantando felizes da vida, com o pequeno Helder no meio da roda a puxar loas e toadas de todos os tempos e lugares.

Deixo aqui uma de suas cantigas, por ele musicada.

Ai vento,
Tu que corres campos, varres mares
Faze voltar o tempo
Que deixei em outros lugares.

Fui...

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Fotografando

O restante dos workshops das fotografias foram feitos hoje. César, Rê e Tili criaram imagens bem interessantes a partir das ilustrações do livro. Usaram bolas de gude, renda, panos, madeira, pedras, sinos, aquário, sacos plásticos, cajons, giz... 




Tiradas as fotos, os meninos partiram para o estudo das páginas 10 e 11, e depois criaram duas cenas, a partir do estímulo de ontem, da conversa sobre os efeitos visuais, etc, e Fernando pediu para que os grupos radicalizassem na proposta de usar apenas duas cadeiras e a narração.


Só deu tempo de apresentar a cena de Marco e Tili, pois os workshops das fotografias tomaram bastante tempo. A cena foi o seguinte: Camille sentou em uma cadeira com o livro do Capitão na mão e começou a ler a história como uma contadora querendo encantar o público, e Marco também sentado perto dela, traduzia de forma objetiva e rabugenta o que ela estava contando.


Na conversa sobre os exercícios, concluímos que o desafio foi cumprido: sem o uso de recursos visuais, a narrativa ficou em primeiro plano, e isso não acarretou em perda de interesse da cena, a solução cênica foi muito interessante deste jogo entre os atores. Sentimos falta apenas do narrador do Marco dar uma resumida na história ao final, para amarrar o sentido do texto. Fê, por fim, pediu que os meninos, para o próximo encontro, associassem os dois workshops, o dos peixinhos e o de hoje, e propôs que os meninos desenhassem uma sobrancelha brava no peixinho do Marco, e talvez um lacinho no “peixinho-contador” da Tilis. As meninas de Recife, que hoje se despediram de nós, ficaram curiosas para saber como será essa síntese das cenas.

terça-feira, 14 de julho de 2009

Páginas


Marco apresentou hoje o workshop das fotografias. As páginas escolhidas por ele foram a 22 e 23. Para realizar a foto de Marco, César se maquiou e fez a figura do Capitão Marinho usando um chapéu que Marco fez com a ajuda de Renata, e usando os adereços que foram trazidos por ele, que também confeccionou o barquinho.


O interessante desse exercício foi ver todo mundo ajudando, e se divertir com o Marco enchendo o saco de Cuca para bater a foto de modo que não ficasse escura, e do César que tremia a mão ao segurar o barquinho. Olha aê a foto que belezura!


Ao terminar a foto de Marco, os meninos aqueceram jogando bola, e depois, a pedido de Fê, eu sugeri uma brincadeira que se chama “Sim, Vamos!”. O jogo é assim: tudo que o condutor disser para os outros fazerem, eles tem que responder “Sim, vamos!” de modo bem animado e cumprir. Por exemplo, se o condutor diz “vamos ser todos árvores!”, todos devem dizer “Sim, vamos!” e fazê-lo. A brincadeira foi bem divertida, apesar de uns estarem mais animados do que outros.


Depois disso, os meninos sentaram e começaram o trabalho de decupar as páginas 8 e 9, em duplas. Após terminarem, eles criaram duas cenas. Marco e Tili tinham que contar a página 8 sem usar nenhum movimento, usando como único recurso a boca. Já César e Rê, podiam usar movimentos, mas não a fala.


Para a cena de César e Rê, o público teve que entrar dentro do escritório, e do lado de fora os dois mostraram, através da janela de vidro, bolinhas de sabão, a sereia indo e vindo em cima do case e Marinho pendurado no anzol, enquanto isso, uma música era escutada dentro do escritório dando o clima da cena, como e a plateia estivesse assistindo um aquário.


O público se divertiu bastante com a cena e com as arrumações dos meninos, como César tirando o anzol e a gente vendo, Rê soltando as bolinhas de sabão que não saíam direito, só a espuma... Marco até comentou de como é interessante que o público assista também aos “bastidores”.


Já na cena de Marco e Tili, eles desenharam dois peixinhos em um cartaz branco e falaram o texto através desses dois orifícios, assim o público só enxergava a boca dos dois. A imagem que os meninos trouxeram foi bem interessante, mas Fê queria que os meninos dessem mais atenção ao texto, a narrativa, o que acabou sendo um pouco negligenciado, pois a imagem foi mais forte do que o texto que estava sendo dito, principalmente porque os meninos estavam narrando com as mesmas palavras do texto, que causam pouco entendimento ao espectador por serem muito descritivas. Houve uma conversa longa sobre a questão do efeito visual vs. Entendimento da cena, o que serve ou não para o que se quer atingir, etc. Foi uma boa discussão, todos saíram instigados e com uma pulguinha atrás da orelha, em especial o Marco. Fê disse que esse exercício será refeito em seguida.

Pele seca, alma úmida.

Uma das atividades realizadas no dia de ontem foi a análise em duplas (Camille e Marco/ César e eu) das páginas 6 e 7 do livro O Capitão e a sereia.. Segue alguns pontos levantados da nossa dupla a respeito da ilustração e o do texto:
*Toda a figura é composta sob uma textura que lembra uma parede. E que remete a um ambiente seco, o sertão.
*Paisagem: Cactos verdes com espinhos, pedras (algumas lembram pedras de arrecifes e outras são texturizadas).
*Tudo o mais que ocupa a ilustração diz respeito a Marinho e sua intervenção no espaço. Tudo que ele traz parece fruto de outro lugar, seja físico ou proveniente da sua imaginação.
*Discordando da paisagem sertaneja, Marinho veste roupa de capitão, segura uma vara de pescar apoiada a um barquinho, além da presença de um aquário com água e um peixinho.
*Além da estranheza das vestimentas de Marinho, o que realmente subverte a possibilidade do real são os seguintes elementos: O chapéu cheio de água, a sombra de água que o acompanha e um terceiro que gerou dúvidas se é ou não da vara, é o anzol com uma pequena bóia que aparece no canto superior a esquerda da página 6. Estes dois ou três elementos nos levam a concluir que o verdadeiro entendimento da ilustração só se faz no campo da metáfora ou da abstração, onde o próprio texto confirma essa chave, essa forma de olhar. “Marinho sempre navegou em sua imaginação marítima por oceanos nunca antes navegados, muito além das terras onde vivia”.
*Assim como a imagem, o texto também é cheio de metáforas: “Olhos azuis como o horizonte que une céu e mar”; “Coração cercado de águas por todos os lados” ; ” Sentir o corpo molhado pelos encantos aquáticos”.

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Dia de imagem e som

Temos gente nova no Barracão! Chegou à sede o trio Lori, Tini e Vivi, três queridas de Recife que estão iniciando um grupo de teatro e vieram acompanhar um pouco o trabalho dos Clowns nessa semana.


Marco iniciou o trabalho musical colocando vários instrumentos no chão com a ajuda dos meninos. Depois, eles começaram a andar pelo espaço, observando os instrumentos, buscando uma pulsação, percebendo o espaço e olhando no olho do outro. Aos poucos, Marco ia fazendo comandos e eles buscaram fazer os sons dos instrumentos internamente e depois externamente, com a boca. Fizeram também um pouco de contato superfície, até chegar ao ponto de realmente tocar os instrumentos, procurando sempre manter o jogo e a pulsação.


Surgiram tanto imagens interessantes como paisagens sonoras! Eu fiz anotações de algumas e depois, durante uma conversa com todos, Fê pediu que elencássemos as coisas mais interessantes que surgiram, dando nome a elas:


- Mangai: catando instrumentos

- Acampamento: junção dos instrumentos

- Homem chocalho: chocalhos por todo o corpo

- Remada da sanfona: o ir e vir das ondas, da insegurança tocando uma sanfona, sem sair muito do lugar

- Duelo de chocalhos: luta entre boi e homem, entre dois homens com chocalhos

- Pé no vazio: de pé em cima do cajon, um pé para fora, instabilidade


As anotações a seguir são de coisas que eu observei.

* Marco e César tocavam sinos, Tilis estava no cajon e Rê na sanfona, isso me lembrou muito a paisagem da caatinga. Depois entraram sino, chocalho  e coquinho, e aí já me remeteu a imagem de uma caminhada contínua pelo sertão.

* Em um momento durante o jogo, Marco começou a dizer texto do Capitão, e César criou um andar interessante com os chocalhos nos pés; Eles começaram a cantar a música tema do Capitão, depois Marco, Rê e Tili seguraram o efeito de mar e perseguiram César, que subiu no cajon, parecendo fugir do canto da sereia.


Depois da conversa sobre o exercício, Fê propôs que, em duplas, os meninos criassem duas cenas, utilizando as coisas que surgiram no exercício de forma que os quatro estivessem em cena.


Na primeira cena, eles faziam crianças, que entraram brincando de pega-pega, depois começam a brincar de adoleta cantando a música Fulô, e o primeiro que saiu da brincadeira (Marco) passou a ser o cabra-cega. Durante a brincadeira os meninos o chamavam e ele tentava pegá-los. César, Rê e Tili usaram o instrumento do mar também. A cena se desenvolveu para o Marinho começando a ficar com um pouco de medo, até ser abandonado pelos sons e ficar sozinho.


Na segunda cena, todos entraram com chocalhos, com César cantando um aboiado e tocando sanfona, tangendo o gado, até que os três entraram na roda que já estava formada pelos cajons, deixaram os sinos caírem no chão, e pegaram o efeito de mar. César subiu no cajon e os meninos passaram a cantar, falar, atormentando ele.


A atividade seguinte foi ler as páginas 6 e 7 do livro do Capitão e esmiuçar todo tipo de informação que as imagens e o texto oferecessem. As duplas César e Rê, Tili e Marco ficaram de postar no blog  as informações discutidas. Após a leitura, Fê pediu que cada um contasse as páginas 6 e 7 do livro; Marco descreveu as páginas com mais floreio, César narrou de forma mais objetiva, Rê narrou como professora da disciplina “André Neves II” e Tili como a tia do pré-infantil. Depois, Fê pediu que Marco sentasse em uma cadeira e desse uma palestra como a Dona Gertrudes, professora PhD em André Neves.


O dia hoje foi muito produtivo e divertido, a condução de Marco e a de Fernando encontraram um diálogo muito legal e, apesar das cenas criadas terem perdido a energia do exercício, o legal foi ver os meninos se doando para o trabalho, sem ter medo de puxar os seus tapetes.

Tempestade

É...parece mesmo que a ressaca que foi anunciada no início de nosso experimento sábado me pegou de jeito. Esse corpinho que Deus me deu resistiu bravamente até aqui. Mas agora, pediu cama. A cabeça é um peso só. Senti a voz indo, devagarzinho a cada vez que tentava falar algo durante nosso bate-papo depois de apresentarmos no Barracantes. É uma espécie de trégua clamada pela carcaça que me sustenta. Tá bom, vai. Não chega a ser uma carcaaaaça. Sei que está bem recheada de tecidus foforium. Mas é que não consigo dosar a minha energia diante de um processo de trabalho. Sou do tipo que tem febres emocionais e algo mais. Não tem como ser diferente depois de uma longa pausa de três anos sem montar. A cabeça é exigida e cobrada de mim o tempo todo. Mesmo quando não quero. Trabalha em sonhos. “Larga d’eu, chulé!” Tsc tsc tsc, pobre homem.

Bom, mas depois de alguns dias sem escrever por aqui, tentarei atualizar minhas idéias em palavras novas, mesmo descrevendo coisas passadas e algumas, até já relatadas. Após insistentes tentativas fracassadas de receber os cajons prontos, com mais de uma semana de atraso, e criando quase uma lenda sobre isso, finalmente eles deram o ar da graça. Senti claramente o constrangimento e as desculpas do músico e luthier que os fez, sugerindo que ficássemos com esses e que ele faria outros mais bem acabados e que até o agradassem mais. Assim, a medida que formos trabalhando, ele vai repondo com novos. Confesso que isso o redimiu em parte pela demora na entrega. Pense numa coisa que me tira do sério é esperar por algo ou alguém. Ô raiva bixiga!! Ufa! Calma, não se estresse... Mas ainda não foi nesse dia que conseguimos brincar com eles. Até os efeitos de mar que o Helder trouxe, não haviam sido manipulados ainda.

No dia seguinte, primeiro que trabalharia a música com o grupo nessa nova etapa pós convidados, sem uma preocupação com resultados, mas sim com o levantamento de idéias e estímulos sonoros, começamos os trabalhos. Há muito tempo tenho pensado num exercício que pudéssemos explorar variações timbrísticas isoladamente para começarmos a brincar com esses instrumentos novos, percebendo suas possibilidades e seus sons característicos. Propus então uma roda delimitada por quatro grupos de timbres diferentes: os cajons, os shakers (chocalho e caxixis), os Bells (sino, metalofone e pin) e os efeitos de mar. Isso dava um total de doze estações. Por isso denominei esse exercício como RELÓGIO. César depois de ter visto o desenho q fiz intercalando o instrumentos nas doze estações, disse que lembrava também uma Rosa dos Ventos. É verdade. Qualquer coisa nesse momento tem sido inspiração pra esse universo que estamos mergulhados. Ó, viram só? “Mergulhados”. Uma hora nos acostumamos, ou cansamos dessa brincadeira. Por enquanto, é experimentar cada vez mais. A regra era que sempre teria alguém no centro com um texto, canção ou movimento, livremente enquanto os outros três que estivessem nas estações estariam tocando os instrumentos por seção timbrística. Por exemplo: César cantando uma canção no centro enquanto eu, Renata e Camille manipulávamos o mar, simultaneamente.

Tenho me inquietado muito com as possibilidades de potencialização musical de instrumentos dialogando com textos, canções e ou movimentos. Esse exercício foi muito legal pra perceber isso na prática. Como se dá a relação do som periférico (os instrumentos tocados nas estações) com o som de quem está em foco (corpo em movimento, voz e texto, voz e canção). Acredito que esse encontro por si só já gera uma música cênica ou uma cena musical, independente do sentido prévio. O objetivo inicial era simplesmente percebermos isso. Mas é óbvio que no decorrer do exercício surgem lampejos de idéias, estímulos, fragmentos de cena em potencial. Aí sim, temos que fazer as relações que nos interessam. É quando chega a hora das escolhas. O que não é o caso. Não é ainda. Ficou muito claro na avaliação que fizemos da importância que tem esse trabalho de livre experimentação com os instrumentos. E a maneira que tem se dado o diálogo da minha direção musical com o que os atores tem proposto. Um exemplo disso foi um momento em que Renata, quando estava com o Metalofone na periferia das estações, sugeriu, enquanto explorava (gosto da palavra “brincar”), ou melhor, enquanto brincava (agora sim) uma melodia simples, mas expressiva. Quando saí do centro e assumi aquele instrumento, retomei aquela melodia e a transformei com um olhar inevitavelmente técnico, o que faz parte dessa minha função musical. Tenho buscado cada vez mais essa relação horizontal e de consciência compartilhada do processo criativo através da música. Temos encontrado juntos esse caminho. Os meninos tem me dado muito retorno sobre o que temos levantado e isso tem revelado possibilidades muito ricas nessa minha pesquisa, que agora, mais do que nunca, tem sido cada vez mais de todos nós.

E assim, veio a seguir um workshop que havia pedido para todos. Criarmos uma melodia em cima da letra proposta por Rafael, a canção SEJA FIRME CAPITÃO, postada aqui por ele na semana em que esteve conosco. Como ponto de partida, indiquei que criássemos uma melodia que tivesse uma estrutura rítmica que quebrasse com a proposta pela letra. Teríamos também a idéia, presente no cavalo-marinho e em outras manifestações populares em que o canto é respondido por um coro após a frase cantada pelo toadeiro (solista). E com essa incumbência de cumprir tal tarefa solicitada por mim mesmo, tem início a minha peleja alucinante nos momentos de criação. Escolhi compor no violão. Essa escolha normalmente se dá quando quero compor algo menos rebuscado, que possa ser executado mais facilmente por qualquer um. É que como tenho limitações mais radicais nesse instrumento, isso aproxima mais do resultado que queria para esse exercício. Aprendi esse recurso quando compunha jingles publicitários, que tem esse caráter de música fácil e pegajosa para vender mais facilmente também. Os compunha quase sempre no violão. O piano, meu instrumento mãe, me coloca com outra postura no instante da composição. Por enquanto tenho preferido o violão e a minha técnica “pata de caranguejo”, usando horrivelmente o polegar e o indicador para tocar as cordas. E vieram as imagens. Quase sempre é assim, a música vem recheada de imagens que praticamente conduzem a composição. E como estou (estamos) muito contaminado, de forma positiva, com todas as influências vividas até aqui, assim surgiu o baião, o compasso 12/8, os cajons, o cavalo-marinho, a dança, a roda, a toada, o desafio presente nas emboladas, o texto do André, as músicas que trabalhamos no início de tudo, o Márcio, o Lima e o recém Helder com seu Espiral de brincadeiras. Na estrofe que diz: “Acredite na barcaça, navegando com bravura, quando a dança descompassa, resistir é aventura”, consegui encontrar uma solução para a idéia dos movimentos das ondas do mar que há muito tempo queria mas não sabia como realizar. Na composição, proponho que cada frase seja dita em cânone pelos atores, onde elas só se encontram no final (...resistir é aventura). A melodia é a mesma para todas as frases, variando apenas a harmonia. Nesse instante me veio a idéia de usar pedaços de ferros com afinações em lá, fá, ré e mi. Notas que dão o movimento harmônico para esse momento no canto, e que poderíamos cantar a melodia, dançando e batendo/tocando esses ferros em momentos precisos. E lá estava eu no dia seguinte com Rafael Teles, nosso produtor, na Compal, uma empresa que trabalha com ferros de todo o tipo. O gentil vendedor que nos atendeu era músico e nos deixou bem à vontade para encontrarmos o que queríamos. Vi que ele achou interessante aquela proposta, de um camarada (eu) com um violão, batendo em ferros de todo jeito. Aos poucos foram surgindo outros funcionários pra entender e ajudar também, meio que timidamente, mas foi muito legal isso. Logo deu o intervalo pro almoço e percebemos que não será tão fácil encontrarmos o que estou querendo. Fiquei de voltar lá. E vou. Na sequência, lá estava eu no Armazém Pará diante de canos PVC, tirando chinela pra bater neles, tirando som como podia. Me senti uma criança descobrindo um mundo novo. Fui para as seções de escovas de limpeza para achar uma que combinasse com um tipo de lixa, encontrando um som interessante. A vendedora que me atendeu disse: “Você é músico? Os artistas são todos malucos, né? Er...tô brincando, viu?” Achei ótimo! Sinto-me careta demais até. É bom experimentar a loucura de vez em quando. Pelo menos essa, assim. Resolvido o que comprar, era hora de experimentar na prática o que estava tão vivo no campo das idéias. Foi difícil segurar só pra mim, sem ligar pra alguém pra dizer do que havia pensado, de como queria fazer. Tenho tentado encontrar o equilíbrio naquilo que deve e que pode ser dito diante da surpresa, ou até da expectativa criada. Tenho guardado mais comigo certas coisas. Engraçado isso num processo tão “arreganhado”, como disse Fernando. Tem hora pra tudo.

Cada um apresentou sua melodia. Muito timidamente e ainda com uma preocupação com o acabamento desnecessária, os resultados já apontam caminhos nessa dinâmica muito bacana. Precisamos repetir isso mais vezes. Na minha proposta musical para essa letra, queria algo que nos colocasse em movimento. Algo que fosse mais do que simplesmente o conforto do tocar ou cantar. Precisamos associar na prática de processo de descobertas o que já venho explorando com mais freqüência nas oficinas. A idéia dos exercícios polifônicos trazidos pelo Ernani e que tem tanta eficiência no resultado de treinamento musical. Fiquei muito feliz com as possibilidades de jogo que esse exercício nos trouxe. Certamente será revisitado outras vezes.