sábado, 20 de junho de 2009

Afinando o Capitão

No finalzinho da manhã, Ronaldo, César e Fernando fizeram a afinação da luz, para o exercício que seria apresentado às 20h. Foi bem rapidinho, já que os refletores já estavam montados.

Mais tarde, de volta à sede, quando entrei, Marco e Camille já estavam brincando com um novo instrumento, o metalofone. Eles dois estavam tocando a segunda parte da música criada por ele em casa. Um som muito bonito. Depois todos foram se chegando, e a Rê pegou o clarinete, César a sanfona, Camille ficou com o metalofone e Marco com a escaleta.

Depois de cada um entender a sua parte, eles tocaram e gravamos esse som! O Fernando deu seu jeitinho e me ajudou a postar aqui a música. É só clicar no “play” aí embaixo:
Clowns de Shakespeare - Tema Capitão e a Sereia

Em seguida, os atores fizeram um aquecimento vocal ao redor do piano, comandado por Marco, já com parte do público presente. Ensaiaram também a canção, que tem como letra a epígrafe do livro do Capitão. Aos poucos as pessoas foram chegando, se acomodando e o exercício começou.

A leitura do texto foi boa, apoiada por sons utilizados em alguns momentos – efeito de mar, sino, “chuá” feito com a boca, triângulo, baião –, sem predominar na leitura, apenas dando-lhe um colorido. Também foram projetadas as ilustrações do livro em um telão. Finalizando o exercício, o autor foi apresentado.

O grupo só conhece o André Neves por conversas por telefone, e-mail e uma foto da última página de seu livro, em que ele está com a mão na testa, meio pensativo. Assim, ao fazer a leitura do texto em que o escritor fala sobre a obra, os atores fizeram o mesmo gesto que ele, com a mão na testa. E a piada deu certo, gerou alguns sorrisos. Aliás, poucos, pois a sede teve um público de umas dez pessoas.

A pesquisadora em literatura e leitura Danielle de Souza trouxe, através de um texto muito bem escrito e até poético, uma apreciação crítica e artística do Capitão. Ela compara o autor a um jovem capitão escritor, e chama atenção por sua dupla habilidade de ilustrar e escrever sem ser redundante.

A linguagem, disse ela, chama atenção para si por suas construções metafóricas, deixando muito a ser construído pelo leitor, uma prosa de caráter cultural forte com fonte na realidade. Danielle também levantou uma pergunta para o público: o encontro com a sereia foi real? Para a pesquisadora, a sereia é o próprio mar, e talvez ela e o capitão tenham se apaixonado um pelo outro. A sereia respeita o Marinho, é a plateia da solidão dele.

Continuando, Danielle citou três passagens. Na página 7, a sombra de Marinho é o mar, a alma do capitão; na página 24, os pés de Marinho sugerem a dúvida, o grande passo que ele dará – para mim, os pés não sugerem dúvida, e sim o desejo de saltar para o oceano tão desejado –; e, na página 29, o olhar da sereia sugere muitas sensações, e eu diria que sugere mistério, assim como o mar. As ilustrações, tão destacadas, trouxeram mensagens e mexeram com os sentidos.

Após a leitura da apreciação crítica feita por Danielle, Fernando situou o público do trabalho que tem sido feito pelo grupo em relação a montagem do Capitão. E assim, o debate começou. Cito abaixo algumas questões que foram levantadas:

1. Entendimento do texto: apesar da leitura tranquila do texto feita pelo grupo, algumas pessoas, como Marcos Martins e Sávio de Luna, disseram que se perderam muitas vezes, e não conseguiram acompanhar o andamento da história. Realmente, a leitura do Capitão e a Sereia não é fácil em um primeiro momento, pois o texto é muito metafórico e descritivo.

2. Sertão x Mar: Fernando falou que o Capitão é uma história do sertão, apesar de ser uma história que fala sobre o mar. Marinho representa e fantasia o mar em suas andanças com a trupe pelo sertão. Para o grupo fica forte a ideia de que, por se passar no sertão, é que o mar ganha tanto significado para Marinho, que sonha com o mundo marítimo.

3. Verticalidade: Marcos Martins falou que gostaria de ver mais os Clowns explorando a verticalidade. A verticalidade que ele se refere, ao meu entender, é uma exploração mais radical do grupo em suas experimentações, diferente do que o grupo tem feito.

4. Distanciamento ou afastamento da ilusão: Fê falou da relação dessa montagem com o afastamento das sensações ilusórias e encantatórias que o livro traz para o leitor. Ele disse que é importante para o grupo que o público perceba que são atores contando aquela história, sem causar ilusões.

5. Resistência do sertão, aspecto político e social: Analwik falou que o texto traz aspectos culturais e sociais fortes, como a riqueza das expressões populares, danças e oralidade. Citou a abundância do mar, e a abundância dessa faceta do sertão.

6. O individual e o coletivo, duas visões: Marinho deixa a trupe. Seria preciso Marinho deixar a trupe em busca do mar, para perceber que ele era feliz no sertão? Nesse momento o debate permeou por um aspecto um tanto filosófico de escolhas do ser humano. Mariana Guimarães falou que era importante para Marinho deixar a sua trupe, e buscar o seu sonho de conhecer o mar, que é importante para ele, como indivíduo pertencente a um coletivo, ter o seu espaço individual, de ser pensante. A partir disso, o grupo colocou que irá contar a história do Capitão a partir da visão da trupe, reconhecendo a importância que as pessoas da trupe tenham seus espaços individuais, pois são pessoas diferentes, e isso fortalece o coletivo. No entanto, não interessa ao grupo fortalecer o pensamento individualista, que está tão presente no mundo contemporâneo, envolto nos princípios neoliberais.

Terminado o debate, ficou o agradecimento às pessoas que estiveram presentes e o desejo de que retornem, para poderem contribuir mais um pouco com esse processo.

3 comentários:

  1. Mui lindo o som que vcs gravaram. Lembra a trilha de Amélie Polan.

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  2. Lindo demais. Mal posso esperar pra ouvir as canções que surgirão daí. Lembra Amélie Poulain mesmo, acho que por causa do som da escaleta/sanfona. Tenho me divertido e me emocionado com esse blog, com os relatos, fotos e agora com essa música. Ao mar, clowns! Ao mar! Abraço grande em todos.

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  3. Lindo...
    Música para embalar sonhos...
    E lembra mesmo Amélie Poulain, mas lembrei também de um outro espetáculo que assiste aqui em Salvador "o olhar inventa o mundo", particularmete amo esta peça ( da companhia teatro dos novos)e também lembrei do cirque de Soleil.
    Na verdade, tudo me remeteu a poesia, num bem querer tremendo.
    Parabéns, parabéns!!!

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